O primeiro dia do resto da minha vida
Não quero transformar o Circo num babyblog nem pouco mais ou menos (para isso já tenho o meu alter ego) mas é um bocado difícil voltar ao activo depois de três meses ausente, sem começar por explicar o motivo dessa ausência. E o motivo dessa ausência, repitam todos comigo, chama-se Filipa. E este era para ter sido o primeiro post pós-Filipa que escrevi, em papel, ainda no hospital...
Dia 4 de Janeiro. São 5h25 da manhã. Quem me conhece diria que já estou boa porque já estou a refilar. Pela janela do quarto vêem-se as luzes do Almada Fórum e eu não vejo a hora de me ir embora. Ainda não preguei olho esta noite. Este hospital parece uma feira cigana. Cada auxiliar tenta gritar mais alto que as outras quando passa pelos corredores, com as portas dos quartos escancaradas. No meio disto tudo, os bebés são quem menos incomoda e os choros deles pelo menos são inocentes. Na parede lá fora há um cartaz que diz qualquer coisa como "não faça barulho, por nossa causa" com uma fotografia de um bebé sorridente, mas às 2 da manhã ainda se ouvia uma TV em altos berros e grandes risotas a acompanhar. Quem cá trabalha é o primeiro a desobedecer às regras básicas de qualquer hospital. Depois dizem que as visitas é que incomodam e fazemm barulho e isso é que me faz subir a tensão e depois restringem-me as visitas por causa disso. Se eu tenho a tensão alta não é por causa das minhas visitas mas sim das visitas das outras!
Depois gritam umas com as outras de uma ponta à outra do longo corredor. Salva-se a competência e simpatia dos médicos e enfermeiras (algumas, não particularmente desta que acaba de entrar aqui e que insiste em fazer consultas às 5 da manhã!!). No fim-de-semana isto correu bem melhor. Tive sorte. O pessoal que cá estava era, segundo fonte bem posicionada já me informou, especialista em neonatologia, e visto agora, vê-se bem a diferença entre umas e outras.
O pouco que tenho conseguido dormir é graças à minha inseparável máscara de zorro mas hoje nem isso me safa. Como tive um episódio de "pré-eclâmpsia ligeira" (foi isso que escreveram no livro), o director de serviço na sala de partos queria que eu ficasse num quarto sozinha mas como não havia vagas, fiquei só com mais uma pessoa que sofreu do mesmo mal, enquanto os outros quartos têm sempre as três camas ocupadas. Para minha sorte é uma mãe cheia de problemas psicológicos, cá para mim com um ligeiro atraso, e com um marido e filha de 10 anos mais atrasados ainda (a miúda de 10 anos mas mentalidade de 5 é particularmente irritante e causou grande parte das minhas dores de cabeça e tensão alta) que passa os dias a chorar a dizer que se quer ir embora. Mas porque o miúdo nasceu com 35 semanas e 2 kg ainda cá está. E nestas alturas de mais barulho consegue ressonar que nem um porco... e por acaso até é parecida com um... mas isso agora não interessa nada.
Esta noite touxeram mais uma mãe com pré-eclâmpsia, para a vaga do meio. Começou logo bem com a antipática da auxiliar (a única verdadeiramente antipática no meio das centenas de pessoas que vi passar por aqui) a mudar-me o berço da Filipa de um lado para o outro da cama "porque o berço é para estar do outro lado". Lado esse diga-se, onde está a mesa de cabeceira, os degraus para sair da cama e mais à frente o lavatório e o caixote do lixo! Limitei-me a perguntar-lhe porquê se me parecia que cabia tudo assim tal e qual como estava e perguntei se era suposto caber tudo do mesmo lado só para eu perceber como é que ia organizar as coisas como as outras pessoas fazem e a estúpida insistiu "tem de ser do outro lado, tem de pôr os degraus para dentro". "Claro e quando eu quiser sair da cama, como é que faço para tirar os degraus de debaixo dela?" Se eu preciso dos degraus para me levantar é porque não me consigo mexer para os tirar lá debaixo, boa? Claro que o QI de menos 30 não deu para responder, enfiou-me o berço do outro lado da cama, comigo encurralada entre o dito e a mesa de cabeceira e foi-se embora. Arre que é burra. Por isso é que o trabalho dela é literalmente limpar a merda dos outros, não dá para mais! Agora chamem-me racista.
Depois foi a vez do aparelhómetro do sulfato de magnésio da nova colega de quarto desatar a disparar um som estridente. Eu estive mais de 48 horas ligada àquela porcaria e não tocou uma única vez. Ela ao fim de pouco tempo já o estava a fazer disparar. Das duas uma, ou é incompetência de quem o colocou ali (que me parece provável porque é a tal enfermeira burreca que faz consultas às 5 da manhã, ok, tou a ser racista outra vez mas é verdade!) ou é porque a miúda insiste em mexer o braço e aquilo é muito sensível. Eu tive o meu ali sossegadinho dois dias para ver se aquilo não disparava e também porque me faz a maior das confusões estar ligada àquelas coisas no braço. E por falar nisso, são quase 7 horas e aquilo não dispara há um bom bocado. Talvez fosse bom eu tentar dormir alguma coisa antes que às 8 da manhã entrem por aqui dentro a fazer visitas novamente...
13 horas - ... o que se veio a verificar precisamente à hora que eu disse. Não ter sido mais cedo foi muito bom. Total de horas de sono esta noite: umas 2. E depois querem que eu fique calma e relaxada e concentrada no bebé e que a tensão não suba e passam a vida a perguntar se me dói a cabeça. Num hospital que a toda e qualquer hora é pior que o mercado ao sábado de manhã e onde não se respeita minimamente a privacidade das mães. Tou farta de ir fechar aquela porta!!
Notícia boa da manhã: os obstetras deram-me alta, tenho uns agrafos lindos (segundo o médico que me deu alta, com quem já me fartei de rir e que por coincidência foi o mesmo que me viu na urgência há um mês atrás) e sou livre para sair.
Notícia má da manhã: os pediatras ainda não chegaram a este quarto, ou seja, estou aqui há horas à espera, sem sequer ir tomar banho com medo que eles apareçam quando eu não estiver e que depois passem à frente e fique ainda mais horas à espera para darem alta à bebé. E como já estamos na hora de visita dos pais e de almoço, agora também não devem cá vir tão cedo. Queria mostrar a luz do dia à minha filha mas já estou a ver que vamos sair daqui à noite. Que se lixe, desde que saia e que consiga dormir sem barulho de fundo uma vez que seja. Estou farta deste corropio, logo eu que sou sensível ao barulho e à luz e à confusão de quem passa. Logo me havia de calhar uma cama mesmo junto à porta, memso junto à sala das tralhas onde as empregadas fazem xinfrim dia e noite, bem no meio da confusão total... e ninguém fecha a porra da porta porquê???
Para ajudar à festa, a rapariga deve estar cheia de fome e o pai nunca mais parece. Acho que vou fazer como a outra da janela, chorar o dia inteiro que me quero ir embora para chamarem a psicóloga para vir falar comigo e eu poder fazer as queixas todas do porquê de não conseguir descansar aqui.
Pouco depois a pediatra apareceu, deu alta à Filipa e por volta das 3 e tal já estávamos a sair do hospital, eu a 5 à hora sem me conseguir mexer, mas estava a sair, mais de 4 dias depois! Ainda era de dia e estava sol! Agora mis friamente, volto a dizer que fui muitíssimo bem tratada, principalmente durante o fim-de-semana. O pessoal médico e as enfermeiras eram espectaculares, incansáveis, quase todos muito simpáticos, desde que entrei nas urgências até me darem alta. O pessoal auxiliar era quase todo simpático também (aquela é estúpida e não há nada a fazer). Agradeço principalmente à enfermeira super querida que me veio perguntar nas duas primeiras noites se eu queria que levasse a Filipa para ficar com ela para eu poder descansar (e aí até dormi bem, depois da passagem de ano acalmar) já que não me conseguia mexer e mesmo que ela chorasse ia ter de chamar alguém. Se eu já tinha boa opinião do Garcia de Orta ainda tenho mais agora. Mas o barulho e a confusão fazem-me pensar duas vezes se lá quero voltar outra vez...
Dia 4 de Janeiro. São 5h25 da manhã. Quem me conhece diria que já estou boa porque já estou a refilar. Pela janela do quarto vêem-se as luzes do Almada Fórum e eu não vejo a hora de me ir embora. Ainda não preguei olho esta noite. Este hospital parece uma feira cigana. Cada auxiliar tenta gritar mais alto que as outras quando passa pelos corredores, com as portas dos quartos escancaradas. No meio disto tudo, os bebés são quem menos incomoda e os choros deles pelo menos são inocentes. Na parede lá fora há um cartaz que diz qualquer coisa como "não faça barulho, por nossa causa" com uma fotografia de um bebé sorridente, mas às 2 da manhã ainda se ouvia uma TV em altos berros e grandes risotas a acompanhar. Quem cá trabalha é o primeiro a desobedecer às regras básicas de qualquer hospital. Depois dizem que as visitas é que incomodam e fazemm barulho e isso é que me faz subir a tensão e depois restringem-me as visitas por causa disso. Se eu tenho a tensão alta não é por causa das minhas visitas mas sim das visitas das outras!
Depois gritam umas com as outras de uma ponta à outra do longo corredor. Salva-se a competência e simpatia dos médicos e enfermeiras (algumas, não particularmente desta que acaba de entrar aqui e que insiste em fazer consultas às 5 da manhã!!). No fim-de-semana isto correu bem melhor. Tive sorte. O pessoal que cá estava era, segundo fonte bem posicionada já me informou, especialista em neonatologia, e visto agora, vê-se bem a diferença entre umas e outras.
O pouco que tenho conseguido dormir é graças à minha inseparável máscara de zorro mas hoje nem isso me safa. Como tive um episódio de "pré-eclâmpsia ligeira" (foi isso que escreveram no livro), o director de serviço na sala de partos queria que eu ficasse num quarto sozinha mas como não havia vagas, fiquei só com mais uma pessoa que sofreu do mesmo mal, enquanto os outros quartos têm sempre as três camas ocupadas. Para minha sorte é uma mãe cheia de problemas psicológicos, cá para mim com um ligeiro atraso, e com um marido e filha de 10 anos mais atrasados ainda (a miúda de 10 anos mas mentalidade de 5 é particularmente irritante e causou grande parte das minhas dores de cabeça e tensão alta) que passa os dias a chorar a dizer que se quer ir embora. Mas porque o miúdo nasceu com 35 semanas e 2 kg ainda cá está. E nestas alturas de mais barulho consegue ressonar que nem um porco... e por acaso até é parecida com um... mas isso agora não interessa nada.
Esta noite touxeram mais uma mãe com pré-eclâmpsia, para a vaga do meio. Começou logo bem com a antipática da auxiliar (a única verdadeiramente antipática no meio das centenas de pessoas que vi passar por aqui) a mudar-me o berço da Filipa de um lado para o outro da cama "porque o berço é para estar do outro lado". Lado esse diga-se, onde está a mesa de cabeceira, os degraus para sair da cama e mais à frente o lavatório e o caixote do lixo! Limitei-me a perguntar-lhe porquê se me parecia que cabia tudo assim tal e qual como estava e perguntei se era suposto caber tudo do mesmo lado só para eu perceber como é que ia organizar as coisas como as outras pessoas fazem e a estúpida insistiu "tem de ser do outro lado, tem de pôr os degraus para dentro". "Claro e quando eu quiser sair da cama, como é que faço para tirar os degraus de debaixo dela?" Se eu preciso dos degraus para me levantar é porque não me consigo mexer para os tirar lá debaixo, boa? Claro que o QI de menos 30 não deu para responder, enfiou-me o berço do outro lado da cama, comigo encurralada entre o dito e a mesa de cabeceira e foi-se embora. Arre que é burra. Por isso é que o trabalho dela é literalmente limpar a merda dos outros, não dá para mais! Agora chamem-me racista.
Depois foi a vez do aparelhómetro do sulfato de magnésio da nova colega de quarto desatar a disparar um som estridente. Eu estive mais de 48 horas ligada àquela porcaria e não tocou uma única vez. Ela ao fim de pouco tempo já o estava a fazer disparar. Das duas uma, ou é incompetência de quem o colocou ali (que me parece provável porque é a tal enfermeira burreca que faz consultas às 5 da manhã, ok, tou a ser racista outra vez mas é verdade!) ou é porque a miúda insiste em mexer o braço e aquilo é muito sensível. Eu tive o meu ali sossegadinho dois dias para ver se aquilo não disparava e também porque me faz a maior das confusões estar ligada àquelas coisas no braço. E por falar nisso, são quase 7 horas e aquilo não dispara há um bom bocado. Talvez fosse bom eu tentar dormir alguma coisa antes que às 8 da manhã entrem por aqui dentro a fazer visitas novamente...
13 horas - ... o que se veio a verificar precisamente à hora que eu disse. Não ter sido mais cedo foi muito bom. Total de horas de sono esta noite: umas 2. E depois querem que eu fique calma e relaxada e concentrada no bebé e que a tensão não suba e passam a vida a perguntar se me dói a cabeça. Num hospital que a toda e qualquer hora é pior que o mercado ao sábado de manhã e onde não se respeita minimamente a privacidade das mães. Tou farta de ir fechar aquela porta!!
Notícia boa da manhã: os obstetras deram-me alta, tenho uns agrafos lindos (segundo o médico que me deu alta, com quem já me fartei de rir e que por coincidência foi o mesmo que me viu na urgência há um mês atrás) e sou livre para sair.
Notícia má da manhã: os pediatras ainda não chegaram a este quarto, ou seja, estou aqui há horas à espera, sem sequer ir tomar banho com medo que eles apareçam quando eu não estiver e que depois passem à frente e fique ainda mais horas à espera para darem alta à bebé. E como já estamos na hora de visita dos pais e de almoço, agora também não devem cá vir tão cedo. Queria mostrar a luz do dia à minha filha mas já estou a ver que vamos sair daqui à noite. Que se lixe, desde que saia e que consiga dormir sem barulho de fundo uma vez que seja. Estou farta deste corropio, logo eu que sou sensível ao barulho e à luz e à confusão de quem passa. Logo me havia de calhar uma cama mesmo junto à porta, memso junto à sala das tralhas onde as empregadas fazem xinfrim dia e noite, bem no meio da confusão total... e ninguém fecha a porra da porta porquê???
Para ajudar à festa, a rapariga deve estar cheia de fome e o pai nunca mais parece. Acho que vou fazer como a outra da janela, chorar o dia inteiro que me quero ir embora para chamarem a psicóloga para vir falar comigo e eu poder fazer as queixas todas do porquê de não conseguir descansar aqui.
Pouco depois a pediatra apareceu, deu alta à Filipa e por volta das 3 e tal já estávamos a sair do hospital, eu a 5 à hora sem me conseguir mexer, mas estava a sair, mais de 4 dias depois! Ainda era de dia e estava sol! Agora mis friamente, volto a dizer que fui muitíssimo bem tratada, principalmente durante o fim-de-semana. O pessoal médico e as enfermeiras eram espectaculares, incansáveis, quase todos muito simpáticos, desde que entrei nas urgências até me darem alta. O pessoal auxiliar era quase todo simpático também (aquela é estúpida e não há nada a fazer). Agradeço principalmente à enfermeira super querida que me veio perguntar nas duas primeiras noites se eu queria que levasse a Filipa para ficar com ela para eu poder descansar (e aí até dormi bem, depois da passagem de ano acalmar) já que não me conseguia mexer e mesmo que ela chorasse ia ter de chamar alguém. Se eu já tinha boa opinião do Garcia de Orta ainda tenho mais agora. Mas o barulho e a confusão fazem-me pensar duas vezes se lá quero voltar outra vez...